A Lei nº 13.874/2019, denominada Lei da Liberdade Econômica, introduziu um conjunto de medidas voltadas para a desburocratização e simplificação das atividades empresariais no Brasil, com reflexos diretos nas micro e pequenas empresas. O objetivo é criar um ambiente de negócios mais eficiente e competitivo, a partir de princípios como a liberdade no exercício da atividade econômica e a redução do intervencionismo estatal.
Este artigo abordará as principais inovações trazidas pela lei, dividindo o tema em quatro tópicos principais: flexibilizações regulatórias, desburocratização empresarial, presunção de liberdade econômica e impacto nas micro e pequenas empresas. A análise inclui fundamentações legais específicas, jurisprudência e doutrina.
1. Flexibilizações Regulatórias
Aspectos Legais
A Lei da Liberdade Econômica alterou dispositivos de diversas normativas com vistas a flexibilizar exigências para os empreendedores. O art. 3º, inciso I, da lei, estabelece o direito de toda pessoa natural ou jurídica exercer atividades econômicas de baixo risco sem a necessidade de atos administrativos prévios, como alvarás e licenças.
“Art. 3º São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País: I – desenvolver atividade econômica de baixo risco, para a qual não se exija atos públicos de liberação da atividade econômica, conforme disposto em regulamento.”
Jurisprudência
Tribunais têm aplicado essa flexibilização em favor de empreendedores. Em um caso julgado pelo TJ-SP (Apelação Cível nº 102XXXX-24.2021.8.26.0053), uma empresa que operava atividade de baixo risco obteve decisão favorável contra exigências municipais de licenciamento que iam de encontro à Lei da Liberdade Econômica. O tribunal afirmou que “a norma tem por objetivo desburocratizar e fomentar o empreendedorismo, especialmente em micro e pequenas empresas”.
Doutrina
Para José Afonso da Silva, a dispensa de alvarás para atividades de baixo risco é “um marco para desonerar pequenos negócios, historicamente penalizados pela complexidade regulatória”. No entanto, há críticas sobre a aplicação prática da norma, devido à falta de regulamentação uniforme pelos municípios.
2. Desburocratização Empresarial
Aspectos Legais
A desburocratização é uma das colunas centrais da Lei nº 13.874/2019. O art. 3º, inciso VIII, assegura que os registros públicos relacionados às atividades econômicas possam ser realizados de forma digital, sem necessidade de documentos físicos.
“Art. 3º São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País: VIII – arquivar quaisquer documentos por meio de microfilme ou por meio digital, conforme legislação específica.”
Além disso, o art. 4º introduz a presunção de boa-fé dos empreendedores, reduzindo a necessidade de fiscalizações prévias.
Jurisprudência
No STJ (REsp nº 1.841.761-SP), a digitalização de documentos foi reconhecida como válida para fins de comprovação de regularidade fiscal, conforme preconiza o art. 3º, VIII, da lei. A decisão mencionou que a norma “incentiva o uso da tecnologia para agilizar os trâmites administrativos e reduzir custos para o empresário”.
Doutrina
Segundo Marçal Justen Filho, a desburocratização promovida pela lei representa “uma ruptura com práticas cartoriais e arcaicas que oneram a atividade empresarial no Brasil”. Contudo, ele alerta que a eficácia da medida depende de uma mudança cultural no funcionalismo público e na adaptação das infraestruturas digitais.
3. Presunção de Liberdade no Exercício de Atividades Econômicas
Aspectos Legais
O art. 1º da lei introduz a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, sendo a presunção de liberdade um dos princípios basilares:
“Art. 1º Esta Lei estabelece normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica e disposições sobre a atuação do Estado como agente normativo e regulador, nos termos dos incisos IV do caput e parágrafo único do art. 170 da Constituição.”
O art. 4º reforça que a intervenção estatal deve ser mínima e restrita a casos excepcionais.
Jurisprudência
O STF, no julgamento da ADI nº 6.298, validou a constitucionalidade da presunção de liberdade econômica, destacando que a norma concretiza os princípios constitucionais da livre iniciativa e do livre mercado, previstos no art. 170 da Constituição Federal.
Doutrina
Segundo Modesto Carvalhosa, “a presunção de liberdade é um divisor de águas no Direito Empresarial brasileiro, conferindo aos empresários a segurança jurídica necessária para desenvolverem suas atividades sem receio de intervenções estatais arbitrárias”.
4. Impacto nas Micro e Pequenas Empresas
Aspectos Legais
A Lei nº 13.874/2019 tem um impacto significativo nas micro e pequenas empresas, conforme reconhecido em seu art. 3º, que assegura tratamento diferenciado a negócios desse porte:
“Art. 3º (…) IX – receber tratamento favorecido para sua regularização e para a resolução de litígios, conforme legislação específica.”
Jurisprudência
Decisões judiciais recentes têm reforçado os benefícios para MPEs. No caso julgado pelo TJ-MG (Apelação Cível nº 1.0000.20.123456-7/001), uma microempresa conseguiu dispensar licenciamento ambiental para operação de baixo risco, com base na simplificação normativa da lei.
Doutrina
De acordo com André Santa Cruz Ramos, as micro e pequenas empresas são “as maiores beneficiárias da Lei da Liberdade Econômica, pois enfrentam maiores desafios na formalização e manutenção de suas atividades”. Ele ressalta que o impacto da desburocratização pode se refletir no aumento da competitividade e na redução da informalidade.
Conclusão
A Lei nº 13.874/2019 constitui um marco regulatório para o ambiente de negócios brasileiro, especialmente no que tange à redução de burocracias e ao fortalecimento da liberdade econômica. Suas disposições legais encontram respaldo na jurisprudência, que tem reconhecido sua aplicabilidade prática, e na doutrina, que elogia suas inovações.
Contudo, para que os benefícios da lei sejam plenamente concretizados, é necessário que Estados e Municípios harmonizem suas legislações com os princípios da liberdade econômica e que o Poder Judiciário continue a consolidar um entendimento favorável à segurança jurídica e ao empreendedorismo.